Remédio errado

Após o tsunami financeiro que varreu os mercados financeiros internacionais em 2007 e 2008, as autoridades reguladoras agora tentam apontar medidas que diminuam a possibilidade de repetição desta crise.

Um ponto que sempre aparece nas discussões sobre os bancos internacionais são as reservas de capitais. Os bancos centrais do mundo partem do pressuposto que maiores reservas de capitais teriam impedido crises como a que ocorreram.

Maiores reservas de capital certamente teriam minimizado os efeitos da crise. Essas reservas adicionais teriam permitido uma quantidade maior de baixas de ativos com valor defasado.

Um ponto que merece ser elogiado do novo acordo é a impossibilidade de retirar do balanço empréstimos e repassa-los a empresas conhecidas como SPV (Special Purpose Vehicles).

Os SPV são equivalentes as SPEs brasileiras, e servem para segregar o risco dos ativos da SPE do restante da empresa, bem como facilitar a avaliação da performance desses mesmos ativos. Só que no caso de problemas nesses ativos, a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações dos SPVs recaía justamente sobre o balanço dos bancos donos do SPV, ou seja, na prática eles burlaram a regulamentação para alavancarem-se e poderem emprestar mais.

Existem ainda outras questões.

As maiores reservas de capital propostas pelos regulamentadores em Basiléia implicam em maior custo do dinheiro e menores volumes de empréstimos, ou seja, a farra de crédito que ocorreu nos EUA e na Europa durante os ultimos 10-15 anos simplesmente não será possível de se repetir. E o encarecimento e diminuição desses créditos vai ser bastante nocivo para as empresas, que terão que apertar margens e reduzir investimentos, reduzindo ainda mais o crescimento dessas economias.

Essas medidas também não lidam com uma questão fundamental da crise bancária: A falha não foi meramente sistemica, foi uma falha de modelo de negócios.

Além do problema dos SPVs, existia ainda a confiança em modelos matemáticos lastreados em premissas consideradas imutáveis é a primeira dela. Os bancos partiam do pressuposto que os driversque alimentavam esse modelo não eram sujeitos as variações de mercado, e quando esses driversse alteraram drasticamente os modelos deixaram de ser válidos. Simplesmente, os modelos geravam valores que não correspondiam mais a realidade.

Uma dessas premissas era o de que o valor dos imóveis iria subir pra sempre, só que essa premissa estava ancorada em outro evento impossível de acontecer, uma eterna expansão dos níveis de crédito nos EUA que aumentaria para sempre o preço dos imóveis por lá. Uma outra era o nível de inadimplência desses empréstimos, que deveriam se manter constante no decorrer dos anos. Guardem esta informação.

Até o agiota da esquina sabe que ele precisa avaliar bem pra quem ele empresta seu suado dinheirinho se ele tem a menor intenção de recebe-lo de volta. E os bancos americanos foram particularmente pródigos na deterioração nos critérios de conceção de crédito. Tomava empréstimo quem queria, pagava quando e como queria sem que fosse preciso dar nenhum aporte inicial ou garantia adicional a operação e sem comprovar nenhuma capacidade de pagamento. Não era preciso falar que ao relaxar os critérios de crédito, você aumenta justamente o nível de inadimplência.

Quando o desemprego começou a subir, a demanda para imóveis travou e o preço dos imóveis começou a cair. Duas premissas fundamentais dos modelos de avaliação de ativos dos EUA afundaram naquele momento e com isso houve a reprecificação dos ativos que geraram os prejuízos que destruíram a base de capital dos bancos americanos.

Essa falta de critério para emprestar dinheiro e má formatação das operações por parte dos bancos e das agências oficiais de hipoteca parece não estar sendo corrigida por parte dos reguladores.

Falta também resolver a questão das agências de classificação de risco. Mooody’s, S&P, Fitch e tantas outras foram as empresas que carimbavam o selo de operação triplo A para as carteiras de empréstimos construídas com base nos critérios que citei e que só baixavam a nota de bancos americanos de A para B somente na semana em que eles iam a falência.

Quanto a uma regulamentação maior ou uma proibição do modelo em que elas são pagas justamente pelos clientes os quais recebem o rating, constituindo assim um flagrante conflito de interesses, nenhum pio em parte nenhuma do mundo.

Tendo em conta que as classificações de riscos dessas agências são utilizadas para propósitos oficiais, elas deveriam estar sujeitas a algum tipo de regulamentação ou pelo menos normatização que proibisse o conflito de interesses.

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