Não disse…

Setembro 15, 2009

Continuando a série sobre a maneira rasteira como o tema defesa é tratado no Brasil, a réplica do blogueiro pode ser achada aqui.

Parece que além de despertar os piores instintos, despertei também o vasto conhecimento do blogueiro sobre o tema, inclusive com algumas novidades sobre caças que, confesso, desconhecia. Vamos por partes.

Ele primeiro começa contradizendo sua própria informação de que os eua não transferem tecnologia.  Agora eles transferem, mas em casos especiais.  Diz o blogueiro:

Bem, se eu mesmo disse que partes do Gripen são fabricados sob licença norte-americana, é claro que os EUA transferem realmente alguma tecnologia.

O sujeito imagina rebater meus argumentos dando exemplos de países que têm licenças para fabricar alguns aviões norte-americanos, tais como a Coréia do Sul, Japão, Israel e Turquia.  Nem é preciso dizer que tais países estão vinculados a tratados com os EUA, sendo que a Turquia é membro da OTAN, Coréia do Sul e Japão tem tratados de defesa mútua com os EUA e Israel, ora, Israel.

Logo, a questão é essa: para o Brasil ter acesso real à tecnologia norte-americana, precisa ter um tipo de relação especial com os EUA que o país não deseja.  É claro que se pode questionar se essa postura é razoável ou não, mas é bom entender que ela não é uma invenção do governo Lula, é uma postura do Estado brasileiro relativamente antiga.  Prova-o aliás o fato de que foi o próprio governo Fernando Henrique Cardoso o responsável por jogar um balde de água fria na proposta da ALCA e fortalecer o Mercosul.

Observem, os EUA transferem >>>alguma<<< Tecnologia. Sendo que existem projetos INTEIROS que contaram com contribuições pesadíssimas dos EUA. O F-16 gerou simplesmente o Lavi israelense, o F-2 japonês e o T-50 da Coréia do Sul. Isso pra não entrarmos aqui em suites ECM, radares, mísseis, e outras coisas mais que contam com tecnologia dos EUA.

Não caro blogueiro, você não se expressou mal. Sua afirmação de que os EUA não transferem tecnologia é falsa.

Agora o fillet mignon da resposta, a parte em que ele fala que para ter acesso a tecnologia americana é preciso ter algum tipo de relação com os EUA. A barriga doeu de tanto rir.

Pra ter acesso a tecnologia chinesa tem que estar alinhado politicamente com aquele país. Pra ter tecnologia russa também, sendo que este país cometia a pachorra de desenvolver uma versão downgraded de TODO o seu equipamento militar para então exportar. E a França, essa alma caridosa, o que é preciso fazer pra ter acesso a tecnologia francesa?

Pra ter acesso a tecnologia francesa nas diversas áreas de cooperação o Brasil está pagando 32 bilhões de reais, o suficiente pra montar uma marinha novinha em folha se fosse comprar em estaleiros estrangeiros ou então desenvolver dois projetos de caça como o Rafale . Se 32 bilhões de reais em compras a valores questionáveis não são uma compra de uma relação especial eu não saberia dizer o que é.

A “relação especial” com a França merece um parentese. De maneira a manter-se independente no desenvolvimento de armas e ter menos interesses geopolíticos em jogo, a França sempre foi menos restritiva quanto a quem vender armamento de ponta devido a necessidade de financiar sua industria militar, visto a economia francesa não ter nem o tamanho da economia dos EUA e nem podia manter-se em estado de guerra como a economia soviética.  Por isso é mais fácil negociar certas vendas com a França. E por isso também a França ser conhecida nos meios militares como a prostituta do mundo.

Achar que os EUA são uma casa de caridade que agiriam em detrimento dos seus interesses é no mínimo ingenuidade em excesso. Não existem santos nesse jogo.

Ele ainda demonstra vasto conhecimento do funcionamento da industria militar mencionando o Arms Export Control Act, ilustrando os seguintes pontos:

“(b) Conduct of program

In carrying out the program established under subsection (a) of this section, the President shall ensure that the program—

(1) provides for the end-use verification of defense articles and defense services that incorporate sensitive technology, defense articles and defense services that are particularly vulnerable to diversion or other misuse, or defense articles or defense services whose diversion or other misuse could have significant consequences; and

(2) prevents the diversion (through reverse engineering or other means) of technology incorporated in defense articles.” [grifos meus]

Como se fosse possível pra um governo estrangeiro fiscalizar engenharia reversa da operação de uma força aérea. O que esses controles impedem é você pegar um F-16 e montar sob licença ou lançar um G-17 e vender no mercado internacional concorrendo com o caça americano. De resto é conversa pra boi dormir e fazer a venda passar no congresso americano.

Existiam dispositivos parecidos no Acordo de Alcantara proposto pelos EUA, isto é, clausulas inócuas que tornariam o acordo politicamente digerível dentro do congresso americano mas que não tinham implicação prática nenhuma. Isso será assunto de outro post.

Continuando as pérolas

Aviões com duas turbinas são aviões de superioridade aérea: voam mais alto, mais rápido, e atacam de mais longe.  Seu objetivo é ou destruir uma força de ataque inimiga que se aproxime ou destruir instalações de defesa do inimigo (radares), tornando sua capacidade antiaérea inoperante.

Essa foi a primeira novidade. Nosso especialista em defesa demonstra seu conhecimento de causa mencionando que caças monoreatores são mais lentos que caças bireatores.  O poderoso F-22 com 70.000 libras de empuxo tem quase a mesma velocidade máxima de um F-16 que possui metade deste empuxo. Como isso é possível? Simplesmente o limite de velocidade dos caças atuais está ligado a limitações estruturais da célula e da turbina do que potência propriamente dita.

Acima de mach 2 a temperatura sobe exponencialmente na célula a níveis críticos. Perto de Mach 3 você precisa de titânio em uma série de partes da aeronave de maneira a garantir a integridade estrutural. Acima disso é assunto para os simuladores de vôo e a nova geração de aeronaves scramjet que está em desenvolvimento.

Mas vamos analisar alguns projetos de caças monoreatores: Mirage III, Mig-21, Mig-23 Viggen e outros monoreatores são aviões de superioridade aérea.

A industria francesa possui ainda o Mirage F-1 e o  Mirage 2000, este ultimo otimizado exatamente pra altas altitudes e longo alcance.

Exatamente o tipo de missão que nosso especialista julga ser tarefas de caças bireatores.

 O segundo motor num caça aumenta custos, aumenta peso aumenta a complexidade e diminui a disponibilidade. Por que um projetista em sã consciência enfiaria um segundo motor num caça então? A resposta é pra melhorar a relação peso/potência do caça.

Todo caça é uma solução de compromisso. Levar uma carga bélica a uma distância X, num envelope de vôo Y dentro de de Z dimensões de projeto. Se você precisa de melhor manobrabilidade ou maior carga bélica você deve precisar de mais empuxo. Se você precisa de mais alcance você vai precisar de um caça maior para suportar mais combustível, e pra não sacrificar manobrabilidade ou carga bélica você adota o segundo motor, que vai gerar mais peso… é esse puxa-encolhe que é o projeto de um caça.

O que acontecia nos anos 50? A única certeza era que a era dos turbo-hélices era passado pra caças militares, e havia necessidade de longo alcance e velocidade. Devido a baixa potência dos motores, aparecem então projetos como o B-52, com 8 turbinas. Apenas a título de comparação, as 8 turbinas TF-33 dos B-52 geram 136.000 libras de empuxo pra levantar o bombardeiro. Uma única turbina GE90 dos boeing 777 gera 115.000 libras.

O que acontecia nos anos 60? Caso você precisasse de um caça mais pesado você tinha que contar com a turbina J-79, que possuía míseras 11000 libras de empuxo seco e 17000 libras de empuxo com afterburner, isto é, literalmente jogando querosene na saída da turbina.

Nos anos 70? Você já poderia usar a F-100 da Pratt & Whitney, que possuía perto de 17000 libras de empuxo seco e 23000 libras em afterburner. Esta é a turbina do F-15. Guardem este detalhe.

Nos anos 80? 18000 de empuxo seco e 29000 libras de empuxo com afterburner. O F-16 dos anos 80 já possuía relação peso/potência superior ao F-4 dos anos 60.

Nos anos 90 aparece a F-119, a turbina do F-22, 25000 libras de empuxo seco e 37000 de empuxo com afterburner.

Agora nos ultimos desenvolvimentos temos a F-135, que garante indecentes 43000 libras de empuxo com afterburner. Ou seja, uma única F-135 vai garantir o que duas turbinas F-100 geravam pro F-15A quando da sua entrada em serviço. Essa mesma turbina garante sozinha quase o empuxo total que as duas anêmicas M88-2 do Rafale garantem.

Ou seja, com 43000 libras de empuxo disponíveis hoje e relações peso/potência superiores a 1:1, não dá pra ficar falando em duas turbinas como pré-requisito para um caça pesado.

Quebrada a barreira da potência e com a confiabilidade das turbinas aumentando, a segunda turbina como salvaguarda deixa de fazer sentido pra maioria dos cenários. Principalmente porque perder uma turbina em combate e ter outra não é garantia de retornar para a base. Vão haver casos em que a segunda turbina vai salvar o dia? Sim, mas o calculo que se faz hoje pela USAF e pela USN é que essa segurança adicional não compensam os trade offs atrelados a ela.

Ainda continua:

O exemplo do F-16 na aviação israelense é muito mal colocado, porque o F-16 é um avião de ataque ao solo _ a superioridade aérea israelense está assegurada pela existência dos F-15.  A Operação Opera, por exemplo (a destruição do reator nuclear iraquiano de Osirak, em 1981), foi conduzida por 8 F-16 que atacaram o reator, mais 6 F-15 para dar suporte aos F-16.

F-16 aeronave de ataque ao solo? Israel voando exclusivamente F-15 para superioridade aérea?

*Falta de ar de tanto rir*

O F-16 desde o início de sua existência foi pensado como um caça de superioridade aérea e com capacidade de ataque terrestre limitada. Ele deveria ser uma solução mais barata para complementar o caríssimo F-15.

Israel, Egito, Holanda, Bélgica e outros early adopters do F-16 o utilizavam como caça, e não como uma plataforma de ataque.

Nos anos 80 com a miniaturização de diversos sistemas o caça ganhou capacidade de ataque e melhoras em suas capacidades ar-ar.

E nos anos 90 as melhoras nos sensores e outros upgrades melhoraram ainda mais o caça, tanto na arena ar-terra quanto na arena ar-ar. O F-16 de fato tem um envelope de vôo mais restrito que o F-15, mas possui sistemas parecidos, utiliza o mesmo armamento e custa mais barato comprar e operar o F-16.

No início desta década Israel fez uma concorrência sobre seu futuro caça entre o F-16I e o F-15I. O F-15I é uma versão do venerável caça americano que utiliza aviônica israelense, foram comprados numa concorrência anterior 25 desses caças. O F-16I é uma versão do F-16 com aviônica israelense e tanques conformais de combustível de forma a extender o raio de ação do caça. Adivinhem o que aconteceu? O F-16I bateu o F-15 na concorrência pelo futuro caça israelense.

Por quê isso? Com os tanques conformais e sistemas melhorados a vantagem oferecida pelo F-15 simplesmente não compensavam seus custos de operação. Em alguns cenários a vantagem de raio de combate do F-15 comparada ao F-16 não é tão significativa. E com o combate aéreo saindo da esfera das piruetas e partindo pra um duelo de sistemas, o F-16I para a IAF demonstrou ser uma alternativa de melhor custo vs benefício em comparação com o F-15I para realizar tanto missões de ataque quanto missões de superioridade aérea .

Existem apenas 52 F-15 nas versões C, D e I, e mais de 200 F-16 ativos em Israel. Enquanto que em 2020 não mais do que 20 F-15 estarão ativos em Israel, pelo menos metade dos F-16 ainda estará em atividade. E eu duvido que Israel pense em garantir superioridade aérea com somente 20 caças.

Conforme fica claro, nosso especialista conhece a fundo o F-16 também o papel deste caça na força aérea israelense.

Continuando:

Ao que eu saiba ainda não se sabe bem qual será o Rafale vendido ao Brasil.  Fala-se em 36 com opção para mais 84, incluindo talvez uma versão naval (coisa que não existe no Gripen).  De qualquer maneira, o parágrafo acima “esquece” todo o resto da discussão, que envolve a transferência de tecnologia, a compra de aeronaves da Embraer pela França, e outras parcerias comerciais que vêm no “pacote completo” (inclusive na questão dos submarinos).

A “estratégia” é agora trazer o pacote de submarinos e helicopteros pra cá. Sendo que excluído o Rafale ainda estariamos falando de cifras pelo menos 9 bilhões de euros e não houve imposição nenhuma da França de só vender o pacote ou não vender nada.

Enrolou, enrolou, pra dizer que ou vem pra cá um caça defasado ou então um caça cujos sistemas ainda não estão desenvolvidos. Ou seja, com riscos e custos de projetos atrelados a ele, de maneira semelhante ao Gripen. 

Quanto ao batismo de fogo no Afeganistão, mandar meia duzia de caças soltar meia duzia de bombas no meio do nada está muito distante de operações sustentadas que F-16, Mirage 2000, F-15, F-4, F-18 e outros enfrentaram.

Continuando:

Aqui o moço tem discurso de armeiro, mas deixa que as árvores ocultem a vista da floresta.  A graça, justamente, de se ter completa transferência de tecnologia é que você se torna capaz de fabricar seus próprios armamentos, ficando livre de problemas como o citado _ que aliás são comuns a todos os três aviões.

Me parece que o rapaz é um aficcionado em armas.  Este perfil se encontra muito em discussões de defesa, mas em geral é gente incapaz de entender as consequências estratégicas deste tipo de decisão.

O blogueiro para então fugir da lambança que fez tentando defender a escolha do caça pelo governo agora apela para “questão estratégica” da “transferência de tecnologia”.

Ele deve ser funcionário público. Toda vez que um funcionário público usa a palavrinha “estratégica” e fala “transferência de tecnologia”, pode ficar certo que isso é justificativa para preços mais altos em licitações e que invariavelmente não geram nenhum resultado adicional além do produto comprado. Só espero que ele não seja político.

Existem maneiras diferentes de se livrar de dependência tecnológica que passem por não comprar pacotes como esse oferecido pela França. A mais óbvia seria manter duas linhas de fornecedores politicamente distantes, como fazem Taiwan e Grécia.

 A segunda seria fomentar uma produção local de um sistema, mas o Brasil tem se mostrado bastante incompetente nessa área. O ponto é que transferência de tecnologia na escala desejada pelo Brasil é algo bastante difícil de se colocar num contrato com as devidas salvaguardas e cujos resultados são bastante complicados se mensurar. 

E quando se fala em transferência de tecnologia pro Brasil, falta um elemento da cadeia extremamente importante:

– Base científica e industrial.

Quem assimila a tecnologia é a base científica, mas é a base industrial que matura os processos e transforma o conhecimento em armamento. O Brasil não tem nenhum dos dois na escala desejada pelo governo, ponto. E não dá pra simplesmente injetar tecnologia e achar que os problemas estarão resolvidos.

Transferência de tecnologia é algo que deve ser feito com bastante cuidado, com escopos bastante claros e limitados e de preferência num projeto empregando a tecnologia em questão e com preços e prazos bem definidos. É assim que se trabalha no mundo inteiro.]

O governo Lula inventou e nosso especialista endossa um novo modelo de transferência de tecnologia: Pagam mais caro pelo produto, assinam um convênio e esperam que a tecnologia brote do nada.

O dinheiro da “transferência de tecnologia” seria muito mais bem empregado no fomento a projetos locais. Mas fiquem certos que investir em projetos locais não geram lobbies elegantes e saudáveis e outros agregados mais difíceis de esconder em transações internacionais.

Eu fico sem saber se uma análise tão ruim por parte do blogueiro deve-se exclusivamente ao baixo nível das fontes primárias no Brasil ou se a cultura de Fla Flu que impede qualquer análise menos primária e mais objetiva sobre o tema.

Escreverei sobre transferência de tecnologia em breve.

Defesa no Brasil? Só a Zaga da seleção

Setembro 13, 2009

Falar de defesa no Brasil é complicado.

Não existe uma cultura de defesa no Brasil, e tem um monte de razões culturais pra isso.

Os militares dão sua cotinha de contribuição sendo esse fiasco de relações públicas. O que não é de todo ruim. Caso eles comecem a chamar demais a atenção pra sí teriam que explicar como uma das forças armadas mais caras do mundo tem esse poder de fogo de país africano.

A imprensa também não. A pouca cobertura que recebe o assunto no Brasil nos grandes meios é realizada por gente como o Roberto Godoy do Estadão, um dos maiores expoentes do mau jornalismo no Brasil.

Garimpando aqui e alí dá pra achar algum site razoável ou blog razoável, mas no geral o nível é bem baixo.

Recentemente um me chamou atenção pelo baixo nível.

O Reinaldo Azevedo tem suas bolas foras. Mas ele na cobertura da compra dos caças da FAB tem feito um trabalho dentro do razoável.

Um blogueiro que se dedica a persegui-lo tentou rebater as acusações do Reinaldo no afã de defender o governo. Vamos aos melhores momentos:

Mas o que eu ia dizer é: a parte inquestionável da negociação era a transferência de tecnologia.  E isso, os EUA não fazem.  Não sei qual era a disposição dos suecos nesse quesito, mas cabe notar que partes críticas do Grippen são fabricadas sob licença norte-americana, logo…outra vantagem do Rafale sobre o Grippen é ser um bimotor _ por razões óbvias.  

Uma terceira vantagem não desprezível é que o Rafale já existe e voa, enquanto o Gripen NG ainda está em desenvolvimento.  E em quarto, pelo que andei lendo, a autonomia de vôo do Gripen é menor. Enfim, o Gripen não é um mau avião,  é mais barato, e parece ser melhor no conceito de guerra data-cêntrica, com melhores data-links que seus concorrentes.  Mas isso não é tudo.

Tem que rir. Uma das maiores coleções de clichês que já ví na vida.

Primeiro, a clássica: Os EUA não transferem tecnologia.

Como se a Coréia do Sul não tivesse fabricado o F-16 sob licença da Lockheed Martin e ainda auxiliado no desenvolvimento do T-50.

Ainda poderiamos citar o desenvolvimento do Mitsubishi F-2, a montagem do F-15J sob licença, o programa turco de upgrade local do F-16 e tantos outros. Acho que não existe nenhum outro país no mundo que transfira tanta tecnologia militar quanto os EUA.

E quais as restrições? Bem, eles vão cumprir somente aquilo que está no contrato, nenhuma virgula a mais. Por isso é tão complicado negociar com a industria americana, pois uma vez colocado no contrato, eles vão cumprir. E também se abster de negociar com países como Coréia do Norte, Irã, Síria e Venezuela. Eu não vejo nada demais nisso.

O segundo ponto é a confusão bi-reator vs monoreator.

A USAF opera monoreatores como o F-16. A IAF, aquela força aérea de segunda classe que tem como habito dar coças homéricas na USN e em seus vizinhos árabes e além de tudo issoopera em um dos ambientes mais hostis do mundo tem como seu caça principal um monoreator (F-16I) e do ultimo bastião dos bi-reatores, a USN, abandonou o barco e partido pros monoreatores.

O que aconteceu nesse período que levou a esta mudança de pensamento?

Primeiro a melhora na relação peso/potência tornou o segundo motor desnecessário na maioria dos projetos. Segundo, o nível de confiabilidades das turbinas aumentou consideravelmente nos ultimos 40 anos. Terceiro, a enorme quantidade de acidentes em que a despeito de uma turbina ainda funcionar o avião ainda caiu.

Uma brincadeira comum nos meios aeronauticos é que, em caso de acidente, a função da segunda turbina é levar o caça do ponto onde a primeira turbina falhou até a cena do acidente.

A rigor, a diferença entre os indices de segurança de caças monoreatores e bi-reatores é estatistica. Sim, certamente haverão casos em que a segunda turbina vai salvar a vida do piloto, e existem cenários onde essa diferença é crítica. A USN sempre focou-se em bi-reatores porque a sobrevivência de seus pilotos era praticamente impossível em determinados cenários, como em operações no mar do norte ou no meio do pacífico. Mas para a maioria dos cenários, a diferença é simplesmente estatística.

Os caças bi-reatores também tem seus contras. Dois motores são mais caros do que um, são consomem mais do que um e tem manutenção mais complexa do que um. E quebram mais do que um. Ou seja, o indice de disponibilidade de um avião bi-reator tende a ser ligeiramente menor do que um monoreator.

Parece que o nosso blogueiro no afã de criticar o Reinaldo se esqueceu de mencionar esses pequenos detalhes que citei.

Depois a vantagem de que o Rafale já voa e o Gripen NG ainda está em desenvolvimento.

Essa afirmação é uma meia-verdade.

O Gripen NG é uma modificação do Gripen C/D que já existe. Inclui remotorização e algumas alterações estruturais na célula e upgrades de sensores.

O Rafale que será vendido pro Brasil ou será o Rafale F3, que será francamente defasado em relação ao Gripen NG e já é defasado em relação ao Block II do F-18E ou será o Rafale F-3+, cujos melhoramentos ninguem sabe nem se vão todos sair do papel e ainda sim serão francamente inferiores ao F-18. Por exemplo, o Rafale nem remotamente apresenta a capacidade de guerra eletrônica que o F-18G possui.

O programa Rafale anda bem problemático na França, sendo que até bem pouco tempo eles sequer podiam lançar bombas guiadas a laser por ausência de integração do POD Damocles de designação de alvos.

Ou seja, enquanto que o programa Rafale possua um risco menor do que o programa Gripen, o programa Rafale está

Existe ainda um agravante. Enquanto o Gripen está integrado com armamento americano e armamento europeu, e o F-18 pode ser integrado facilmente com armamento israelense, o Rafale só está integrado com armamento francês, que é CARO, e alguns armamentos europeus.

O risco político também existe com a França. A primeira coisa que os franceses fizeram quando os ingleses entraram em guerra contra a Argentina foi justamente fornecer os codigos fontes e esquemas dos mísseis exocet para ajudar a marinha britânica a combater o míssil.

Em outro post, nosso especialista comenta sobre a vantagem do Rafale sobre o F-18E:

Segundo: o Hornet está no fim de sua curva de desenvolvimento.  É um caça de quarta geração, enquanto o Rafale é da chamada “geração 4,5″.  É claro que uma transferência integral de tecnologia de 4a geração seria melhor que uma TT “meia boca” de um de 4,5 mas, “ceteris paribus”, é melhor ficar com o 4,5.

O Hornet está no fim da sua curva de desenvolvimento? Ora, a depender da USAF vamos ter Hornet voando até pelo menos 2030, e do jeito que as coisas andam apertadas na USN, pode ser que ele ainda vá mais longe. A própria Boeing já fala em um Hornet Block III, e enquanto o F-18E tem a maior gama de armamentos já lançada por uma aeronave, o Rafale é restrito a armamento francês mais caro que o armamento americano. Isso pra não falar de desenvolvimentos como radares Phased Array já estão operacionais há mais de meia década enquanto que o radar phased array francês ainda é um projeto, e a melhor suite de contra-medidas do mundo que é americana.

No fim da curva de desenvolvimento está o Rafale, que ninguém sabe como fica nem quanto vai custar manter a aeronave quando a linha de produção fechar daqui há alguns anos e que está com pelo menos 10 anos de atraso em relação a radar e contra-medidas. E uma das raras unanimidades no mundo aeronautico militar é o pós-venda ruim dos franceses.

Esse conjunto de fatores (caça caro + armamento caro e limitado + sistemas caros e defasados + serviço de pós-venda ruim) somados as piores condições de financiamento dos caças americanos e britânicos é o que vem fazendo a França progressivamente perder clientes a cada geração de caças que fabrica. E o Rafale vem sendo escorraçado sistematicamente das concorrências das quais participa exatamente pelos problemas que citei. Pra defender no governo vale tudo.

Esse é só mais um exemplo de vários que se encontram em foruns de Defesa no Brasil em que uma compra técnica de bilhões de dolares é reduzida a um Fla-Flu. Não dá pra esperar muito de um país que trata bilhões de dolares dessa forma.

Remédio errado

Setembro 9, 2009

Após o tsunami financeiro que varreu os mercados financeiros internacionais em 2007 e 2008, as autoridades reguladoras agora tentam apontar medidas que diminuam a possibilidade de repetição desta crise.

Um ponto que sempre aparece nas discussões sobre os bancos internacionais são as reservas de capitais. Os bancos centrais do mundo partem do pressuposto que maiores reservas de capitais teriam impedido crises como a que ocorreram.

Maiores reservas de capital certamente teriam minimizado os efeitos da crise. Essas reservas adicionais teriam permitido uma quantidade maior de baixas de ativos com valor defasado.

Um ponto que merece ser elogiado do novo acordo é a impossibilidade de retirar do balanço empréstimos e repassa-los a empresas conhecidas como SPV (Special Purpose Vehicles).

Os SPV são equivalentes as SPEs brasileiras, e servem para segregar o risco dos ativos da SPE do restante da empresa, bem como facilitar a avaliação da performance desses mesmos ativos. Só que no caso de problemas nesses ativos, a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações dos SPVs recaía justamente sobre o balanço dos bancos donos do SPV, ou seja, na prática eles burlaram a regulamentação para alavancarem-se e poderem emprestar mais.

Existem ainda outras questões.

As maiores reservas de capital propostas pelos regulamentadores em Basiléia implicam em maior custo do dinheiro e menores volumes de empréstimos, ou seja, a farra de crédito que ocorreu nos EUA e na Europa durante os ultimos 10-15 anos simplesmente não será possível de se repetir. E o encarecimento e diminuição desses créditos vai ser bastante nocivo para as empresas, que terão que apertar margens e reduzir investimentos, reduzindo ainda mais o crescimento dessas economias.

Essas medidas também não lidam com uma questão fundamental da crise bancária: A falha não foi meramente sistemica, foi uma falha de modelo de negócios.

Além do problema dos SPVs, existia ainda a confiança em modelos matemáticos lastreados em premissas consideradas imutáveis é a primeira dela. Os bancos partiam do pressuposto que os driversque alimentavam esse modelo não eram sujeitos as variações de mercado, e quando esses driversse alteraram drasticamente os modelos deixaram de ser válidos. Simplesmente, os modelos geravam valores que não correspondiam mais a realidade.

Uma dessas premissas era o de que o valor dos imóveis iria subir pra sempre, só que essa premissa estava ancorada em outro evento impossível de acontecer, uma eterna expansão dos níveis de crédito nos EUA que aumentaria para sempre o preço dos imóveis por lá. Uma outra era o nível de inadimplência desses empréstimos, que deveriam se manter constante no decorrer dos anos. Guardem esta informação.

Até o agiota da esquina sabe que ele precisa avaliar bem pra quem ele empresta seu suado dinheirinho se ele tem a menor intenção de recebe-lo de volta. E os bancos americanos foram particularmente pródigos na deterioração nos critérios de conceção de crédito. Tomava empréstimo quem queria, pagava quando e como queria sem que fosse preciso dar nenhum aporte inicial ou garantia adicional a operação e sem comprovar nenhuma capacidade de pagamento. Não era preciso falar que ao relaxar os critérios de crédito, você aumenta justamente o nível de inadimplência.

Quando o desemprego começou a subir, a demanda para imóveis travou e o preço dos imóveis começou a cair. Duas premissas fundamentais dos modelos de avaliação de ativos dos EUA afundaram naquele momento e com isso houve a reprecificação dos ativos que geraram os prejuízos que destruíram a base de capital dos bancos americanos.

Essa falta de critério para emprestar dinheiro e má formatação das operações por parte dos bancos e das agências oficiais de hipoteca parece não estar sendo corrigida por parte dos reguladores.

Falta também resolver a questão das agências de classificação de risco. Mooody’s, S&P, Fitch e tantas outras foram as empresas que carimbavam o selo de operação triplo A para as carteiras de empréstimos construídas com base nos critérios que citei e que só baixavam a nota de bancos americanos de A para B somente na semana em que eles iam a falência.

Quanto a uma regulamentação maior ou uma proibição do modelo em que elas são pagas justamente pelos clientes os quais recebem o rating, constituindo assim um flagrante conflito de interesses, nenhum pio em parte nenhuma do mundo.

Tendo em conta que as classificações de riscos dessas agências são utilizadas para propósitos oficiais, elas deveriam estar sujeitas a algum tipo de regulamentação ou pelo menos normatização que proibisse o conflito de interesses.

Olhe, mas não toque. Toque, mas não pegue…

Setembro 8, 2009

No dia 05 de setembro saiu uma singela reportagem no terra sobre uma modelagem de bomba atômica realizada dentro do IME.

Não é preciso dizer, a pesquisa gerou um tremendo mal-estar na AIEA e no Ministério das Relações Exteriores, este último indo tomar satisfações junto ao MinDef.

O Jobim defendeu a legitimidade da pesquisa e disse que não era da conta de nenhum orgão estrangeiro o que o IME pesquisava e deixava de pesquisar.

Eu concordo, o Jobim não deve dar explicações a orgão estrangeiro nenhum. Deve antes de tudo dar explicações ao contribuinte brasileiro, que custeou a pesquisa.

O primeiro ponto que deveria ser explicado pelo Ministério da Defesa é o porquê de um físico de uma instituição militar realizou uma pesquisa pra modelar uma ogiva nuclear.

O segundo ponto seria explicar qual a utilidade prática de modelar uma ogiva nuclear. Eu só consigo enxergar uma: Fabricar uma bomba nuclear.

Para um país que supostamente abandonou suas ambições militares nucleares ainda no governo Sarney, trata-se de um ponto que deve ser muito bem explicado, principalmente porque o Brasil dispõe de outros elementos de um sistema de mísseis nucleares.

O Brasil dispõe de minas de urânio, possui as centrífugas para enriquecimento de urânio, e o lançamento poderia ser providenciado pelo rojão do CTA, vulgo VLS, que é basicamente uma adaptação civil do que seria o míssil da FAB utilizado para levar nossa ogiva nuclear até Buenos Aires.

De fato, a existência de um estudo como este está longe de representar um passo definitivo do Brasil em direção da bomba atômica. Um sistema nuclear precisa de uma cadeia industrial, de manutenção e operação que não pode ser criada rapidamente e que o Brasil hoje não dispõe. Mas o fato é que o Brasil avançou na modelagem da bomba, o que é um passo bastante significativo para a construção de uma.

O mínimo que poderia se esperar do governo seria uma explicação em relação a pesquisa. Provavelmente, não teremos uma. Resta saber se a arma nuclear é mais uma cruzada das forças armadas brasileiras para entrar no seleto clube disto ou daquilo, como o submarino nuclear da MB ou o VLS  da FAB. Daquelas que costumam custar fortunas ao contribuinte brasileiro e não dar em nada no fim das contas.

Hello world!

Setembro 7, 2009

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